Conto de Natal #O dia começou branco
Maria Neves
Conto de Natal
#O dia começou branco
Foi numa manhã de Dezembro, o dia acordou branco. Eu apressei- me a ir à janela do salão, para programar a nossa Tarde Inesquecível, quando o sol derretesse o gelo.
A azáfama era grande, os homens conversavam sobre a qualidade do azeite do ano corrente, por entre uns copos de aguardente para aquecer a alma, na pausa do trabalho, enquanto eu ouvia com muita atenção as fases da preparação da azeitona, antes de ir para o Lagar de azeite.
Após o almoço, eu saí de casa bem sorrateiramente e fui "montar a tenda."
Eram umas duas horas da tarde, o sol não aquecia, parecia que as estrelas estavam contra.
O celeiro da quinta tinha uma eira, onde eram preparados no Verão os cereais, e no Inverno a azeitona era limpa de folhas e resíduos.
Atrás do celeiro batia o sol, estava muito agradável.
Tinha chegado a hora. A Tia Maria, a irmã mais velha do meu pai, solteira, era a nossa Preceptora. Ela ajudava em tudo, mas não queria ser mencionada. Pendurámos atrás da parede nas argolas onde se prendiam os cavalos, uma manta de linho antigo. Seguem-se dois paus espetados no fundo de um posseiro de verga, virado ao contrário, um de cada lado. Tudo bem amarrado com cordas . Fomos buscar dois cobertores para os laterais. À frente uma tábua do celeiro fez o balcão. E pronto, estava pronta a tenda da Feira de S. Miguel.
( Feira anual da vila, do qual é padroeiro).
Então fui buscar os meus quatro manos para a tenda. Eles respectivamente tinham, nove, oito, seis e quatro anos. Talvez a melhor tarde, todos, e sem os olhos da minha mãe, e o Natal tão perto.
Previamente tinha sido colocado lá, pela Tia Maria, um cesto com pão fresco do forno da quinta, o queijo que a Tia Augusta, a irmã do meio do meu pai tinha oferecido, doces, leite quentinho no termo, frutos secos, a chupeta suplente da Mana mais nova, que se a Bendita faltasse, não se calaria um segundo, muito riso e música com cassetes.
A Tia Maria colaborava, mas dizia baixinho " Ainda vou pagar por isto, mas vale a pena".
O meu pai, com um olhar sorumbático, dizia:
Prefiro não comentar, mas até é uma vergonha, com "pessoas de fora" aqui a trabalhar, mas eles estão a divertir-se com a Tia, que é igual a eles, para o que lhe havia de dar!
A prova do azeite novo, seria na noite de Natal. Como eu sinto alguma nostalgia, quando lembro a minha infância e adolescência.
A hierarquia da Prova. Primeiro sempre os mais velhos, que emitiam um parecer. Quando chegava a vez da menina mais velha, Eu, dizia : Tão bom pai! Melhor que no ano passado! Saudades. Dizia sempre igual.
Hoje eu lembro com tanto carinho, o quanto fomos felizes e não sabíamos.
Maria Neves
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